Psicografia
do Futuro
O grito do condenado
jogado no chão,
O vazio imperceptível da
dor,
A incerteza pérfida de
existir,
Tudo isso agoniza a
solidão,
Deixa-me num estado de
torpor
Esperando sempre a hora de
cair.
Não sei mais o que de mim
sentir
Se é calado que permaneço
atento
Quando a morte dilacera a
alma
De tudo o que há por
consumir
Até ao derradeiro momento
Em que morro, e tudo se
acalma.
É uma psicografia sem emoção
Como se em determinada
altura
A minha alma partisse aos
quatro ventos
Na bonança trazida pela
ilusão
De ter vivido na graça e
na candura
Perpétuos vícios sem
sentimentos.
Talvez um dia me ache na
suposição
Da letargia de ter
existido
Numa qualquer berma de
estrada,
Uma vida já em
decomposição,
Ideando um rumo sem
sentido,
No caos que ficou uma
vida inacabada.
Sinto-me condenado sem
julgamento
Eternizando a dor
dilacerante,
Perpetuando o destino de Sísifo.
Só a morte reina no
pensamento,
Penso nela a cada
instante,
Sem temor nem nenhum
artifício.
Queria poder ser
anti-social;
Odeio o mundo que me
observa,
Sempre vendo como ajo e
me sinto,
Achando que assim sou anormal
Ou que me porto de
maneira diversa,
Ou que acham que apenas
minto.
Não; o grito do corvo
estridente
É um aviso do que vem.
Sonhar aplaca a minha dor
Mas é flagelo sempre
presente,
Uma dor que ninguém tem,
Uma vida vazia e sem
amor.
Erguem-se soturnos e
derradeiros
Os espectros do meu
passado
Que retornam a mim,
amiúde;
Sonhos fugazes, mas
verdadeiros,
Falam-me do que me deixou
marcado
De um tempo agreste e
rude.
O grito vazio do
condenado
Já foi sepultado em vala
comum
Até ficar esquecido, sem
glória.
Tudo o mais ficou oculto,
ignorado,
Sem ter destino nenhum,
Sem se aventurar na
eterna memória.
MARIANO MENDONÇA LOPES