Os outros buscam o poder,
a fama e a glória, perseguem a felicidade e o dinheiro; eu busco a mim mesmo.
Ávidos dos desejos materiais que lhes instrumentalizem a falsa percepção de
felicidade, perdem-se no emaranhado ilusório que se evade das vidas e se eclipsa
no tempo, e erram na vida em busca de fardos vazios, de volumes ocos, de uma
coisa alguma sem matéria. Eu busco o conhecimento que se insinua nas veredas
sinuosas da vida, que se entremeia nos edifícios singelos que a História
plantou, que se acumulou nos diálogos perdidos das civilizações e em toda a
filosofia dos sentidos. Busco conhecer a mim mesmo, do quanto eu fui e do
quanto eu sou para vir a ser um outro que renasce em mim todos os dias,
alumiado por esse archote do conhecimento que me vai alumiando o caminho. E o
caminho é por aonde vou, naquilo que vou, na forma como vou. O caminho nasce
quando eu ando, porque só a Via é eterna e é o Universo que me elucida sobre o
melhor trajeto a seguir na vida, bastando apenas ser arguto e entender os seus
sinais. Vivo, por isso aprendo a ser melhor; conheço, por isso aprendo a errar
menos; medito; por isso aprendo a refletir sobre os mistérios do Universo.
Ando na chuva fria porque
já caminhei no sol ardente e me delicio com os alvores do dia porque já sofri
com a solidão da noite. Percorro a vida porque já enfrentei a morte e na dor da
ausência há o amargo trevo da saudade de um tempo que não volta, de uma pessoa
que não mais verei, de uma memória que passou e que agora se aloja no meu
coração e vai descendo devagar e insinuosamente até alcançar a alma onde
deveras se esconde. Sou um guardador de inúmeras e infindáveis memórias do
mundo e que agora, porém, se recolhem à solidão de um quarto, de um mero
aposento de vida de quatro paredes onde ainda viceja a felicidade que é viver,
que é existir. Vejo o quarto onde moro e os objetos que nele permanecem,
indiferentes à minha vontade. Mas estariam eles aqui se neles eu não pensasse,
se deles não cogitasse a sua existência?..
Por tudo aquilo que vivi em toda a minha vida, em tudo o que senti, no
amor e no ódio, na alegria e na dor, na saúde e na doença, deixei pedaços de
mim espalhados por esse mundo, por pessoas que mal conheci e outras que, de
tanto bem conhecer, parece que se apagaram das suas próprias vidas e apenas
deixaram uma luz em mim, como uma estrela fulgurante piscando no céu a luz
derradeira perdida há milhões de anos. “Por tudo aquilo que vivi em toda a
minha vida, em tudo o que senti, no amor e no ódio, na alegria e na dor, na
saúde e na doença...”, parece até que estou a fazer juras de amor no altar da
vida, diante do sacerdote do Tempo ao desposar a minha vida e tudo o que ela me
traz, como a noiva arrebatadora por quem todo o homem se apaixona.
O meu pensamento é
caótico, tempestuoso e livre, transversal à evolução das coisas, como se
buscasse ser a contramão de todos os sentidos. Percorro os meandros que a vida
me coloca em labirínticos desafios, em busca de um sentido que dê a toda essa
expressão catártica que irrompe abruptamente na minha visão, que me violenta
sensorialmente para que eu consiga enxergar o que de mim se aparta, para que eu
consiga perceber o que em mim se oculta, para que eu consiga, enfim, crescer
exponencialmente na minha consciência, e na consciência de todas as coisas.
Verifico que há tanto por aprender quanto na vida há por amar todas as coisas
porque na expressão do amor se sente deveras a expressão do saber e do
conhecer, como se um e outro andassem de mãos juntas em tormentos e
sobressaltos para enfim se acharem num qualquer remanso da vida, celebrando a
vida e o que ela nos traz na augusta sabedoria do prazer sensorial e, porque
não, carnal.
MARIANO MENDONÇA LOPES
[Extraído da minha obra, "As Faces de Maya"]
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