Raul amava o vento que sussurrava
nas copas das árvores ou que perpassava pelas frestas das janelas, acendendo
assobios dilacerantes nas noites impetuosas de tempestade. Era capaz de
contemplar demoradamente o sinuoso balanço dos ramos, dançando harmoniosamente
as sinfonias das intempéries ou, em tempos estivais, a cálida e preguiçosa
brisa que mal conseguia convencer uma planta a se mover. Raul guardava sonhos
como quem guarda ventos trazidos pela tempestade, como quem quer abraçar o
vento para guardá-lo aconchegante e seguro na sua casa; enxergava os ventos
como murmúrios confidentes que uma qualquer divindade lhe confidenciaria em
demorados sussurros num sôfrego de inspirada iluminação interior; sussurros
enigmáticos que ia decifrando no compasso da vida, uma Esfinge interpretada na
leitura dos elementos, a paleta de vida que o sol tinge demoradamente nas
sombras, e assim se passavam horas contemplando o jardim, abraçado à tecnologia
e aos livros, assim a casa se fazia templo de um Universo onde o Tempo é mais
do que a dimensão, é o silêncio da eternidade, é o éter daquilo que É. Quando o vento se
estendia inerte sobre as copas das árvores nos dias de calor pesado, Raul
divagava longamente sobre a origem do ser, do Universo, de tudo, mas sem
esquecer o momento presente que palpitava ali tão ardentemente em seu sangue
jovem em ebulição de uma existência emergente. Voltava aos livros que lhe davam
margem ao sonho selvagem da tempestade, viajando por jardins viçosos de
nenúfares arrebatadores, de narcisos esvoaçantes ou de dálias brilhando
loquazes na condição da Primavera.
[Extraído do conto "O Guardador de Ventos", da minha obra "Encontros"]
📖
ResponderExcluir