As palavras não precisam
ser escritas para serem sentidas, nem precisam ser vividas para serem
verdadeiras. Basta serem retratos da alma a que juram fidelidade. Tudo o mais
nós mesmos construímos no dia que passa e vai arrastando emoções.
As imagens não têm que
valer mil palavras para serem atuais, para terem a força de existir e
contrariar o pensamento. Para serem imagens, apenas têm que nascer perante
nossos olhos em prodígios de ilusão no mesmo filme quotidiano aonde vamos
interpretar máscaras de realidade. Mas as imagens não têm o fascínio das
palavras que lavram o destino de todos nós no destino de um só, o texto que se
inaltera e permanece arrumado nas nossas vidas, nos nossos arquivos. Porque as
palavras vivem em nós depois de mortos, enquanto as imagens morrem com os
nossos olhos.
As palavras trazem os
sentimentos no olhar de quem os vive, sentimentos que mergulham intrépidos num
oceano de emoções, de ínfimas melancolias que o existir hoje pode deixar no
amanhã, como as ondas que vão morrer na praia, arrastando algas e garrafas,
madeiras e tesouros. As palavras esculpem sensações em metamorfoses delirantes,
em devaneios sombrios, em contemplações vagas, sonhos que não se cumprem ou
ambições desmedidas que ultrapassam o horizonte e já se querem instalar no
futuro. Sentimos o afeto que perpassa na alma como um texto construído pela
força das nossas ideias, pelo vigor dos nossos sentidos. Há almas despertas com
o desabrochar resplandecente brotado pelas palavras nos nossos corações, há
razões ocultas que o texto insiste em não revelar, palavras que não estão
lavradas senão no segredo guardado por cada um de nós no recôndito espaço da
sua mente onde as palavras trabalham desenfreadas para buscar um novo sentido à
vida entre tantos outros sentidos que se parecem perder no tempo.
E por existirmos, e por
lutarmos contra a indiferença do mundo, construímos textos em castelos de
palavras, pétreas emoções que o tempo esculpe com o labor meticuloso de quem
não tem pressa e procura apenas a perfeição. E no texto assim construído
esvoaçam novos sentidos ao sentido original da palavra, novas emoções à comoção
desperta pelo sentido da vida, aos olhares circunspectos que miram e contemplam
cada uma das nossas interpretações, dos encaminhamentos que o destino dá ao
vigor sensorial que as palavras constroem, projetando imagens de vida e de
esperança num futuro que, ali parado, é apenas um esqueleto frio, desprovido de
qualquer luz ou brilho, aguardando apenas o sopro da vida, o calor da
felicidade. E é nesse oceano de intensas vigílias da nossa existência que
guardamos maravilhados os sentimentos profundos que vamos transportar com a
nossa mente pelo exercício fantástico e maravilhoso que as palavras emprestam ao
nosso presente, à nossa condição humana.
[Extraído da minha obra, Impressões do Mar]
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado pelo seu comentário!