quinta-feira, 25 de julho de 2019

Prosa

A minha vida é um cais de eternas partidas, amizades ausentes que se despedem na flor da alegria e da descoberta, rostos que se esvaem quando figura neles um olhar de esperança, de amor quiçá; a minha vida é um rosto vencido na multidão, o mundo passa e eu me afasto, parece que tudo vai, que tudo sai, que tudo cai. A minha vida tem um quê de rocambolesco; tudo acontece dentro de uma determinada linha, contudo nada acontece que possa sair, se imiscuir da mundanidade, aviltada condição de ser igual a todos os outros e, contudo, não se parecer com nenhum. Vejo a luz ao fundo, mas não vejo o túnel. E olho, como se procurasse a máscara para me fazer de personagem, como se buscasse o retrato para fazer a pose, como se atirasse o barro sonhando encontrar a parede. Parece que os polos se inverteram, parece que os papeis se inverteram, parece que tudo caiu ou então se ausentou para parte incerta. E vejo, como nos demais capítulos da minha vida, um final infeliz, feito de contrastes, feito de um não sei o quê de ganhar o mundo e me perder de amores, de encher o mundo e me acabar sozinho por becos e vielas, travessas e travessuras, acabado no porto, aeroporto ou eu sei lá o quê. Como todo o navio que parte, a minha vida é um cais de despedidas e partidos corações.

 
No meu coração de criança, há barquinhos de papel que vogam placidamente pelas águas do lago, que transportam em sua frágil condição sonhos robustos que hão de alcançar o mundo. Cada barquinho de papel é um sonho que a vida me deixou, que o meu eu desejou. No meu coração de criança, há um porto que nunca me abandonou...


MARIANO MENDONÇA LOPES [Texto extraído da minha obra, Impressões do Mar]

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